
Vou dar uma "sumidinha", bye.
Noite ainda, quando ela me pedia
Entre dois beijos que me fosse embora,
Eu, com os olhos em lágrimas, dizia:
Espera ao menos que desponte a aurora!
Tua alcova é cheirosa como um ninho...
E olha que escuridão há lá por fora!
Como queres que eu vá, triste e sozinho,
Casando a treva e o frio de meu peito
Ao frio e à treva que há pelo caminho?!
Ouves? é o vento! é um temporal desfeito!
Não me arrojes à chuva e à tempestade!
Não me exiles do vale do teu leito!
Morrerei de aflição e de saudade..
Espera! até que o dia resplandeça,
Aquece-me com a tua mocidade!
Sobre o teu colo deixa-me a cabeça
Repousar, como há pouco repousava.
Espera um pouco! deixa que amanheça
E ela abria-me os braços. E eu ficava.
II
E, já manhã, quando ela me pedia
Que de seu claro corpo me afastasse,
Eu, com os olhos em lágrimas, dizia:
Não pode ser! não vês que o dia nasce?
A aurora, em fogo e sangue, as nuvens corta...
Que diria de ti quem me encontrasse?
Ah! nem me digas que isso pouco importa!...
Que pensariam, vendo-me, apressado,
Tão cedo assim, saindo a tua porta,
Vendo-me exausto, pálido, cansado,
E todo pelo aroma de teu beijo
Escandalosamente perfumado?
O amor, querida, não exclui o pejo...
Espera! até que o sol desapareça,
Beija-me a boca! mata-me o desejo!
Sobre o teu colo deixa-me a cabeça
Repousar, como há pouco repousava!
Espera um pouco! deixa que anoiteça!”
E ela abria-me os braços. E eu ficava.
Eduardo Weiss
A preocupação com a saúde, bem como a preservação do meio ambiente através de técnicas de cultivo diferenciadas, somadas ao sabor atraente e maior teor nutricional, vêm motivando cada vez mais consumidores a dar preferência a alimentos orgânicos. A afirmação é da pesquisadora da Embrapa, Neide Gonçalves, doutora em Ciência dos Alimentos.
A especialista relata que pesquisas da Embrapa constataram que esses produtos têm chamado a atenção dos consumidores por serem mais saborosos e frescos do que os cultivados da maneira convencional. “Na avaliação dos consumidores, eles apresentam maior firmeza e quantidade de suco em algumas frutas”, revela.
O valor nutricional dos produtos livres de agentes químicos também é alvo de estudos da Embrapa. A pesquisadora afirma que nos alimentos produzidos a partir de técnicas de plantio orgânico foi verificado um maior teor de matéria seca, o que revela um menor índice de nitrato, substância que pode se tornar cancerígena se for ingerida em alto teor. “Essa matéria seca confere maior resistência ao produto, maior teor de fibra, e essa importante redução no teor de nitrato, que é encontrado em altos índices nos alimentos produzidos com agentes químicos”, conta.
Outro diferencial é a durabilidade. Estudos revelam maior facilidade para armazenamento: a resistência se dá por conta de substâncias que ajudam a prevenir contra o ataque de microorganismos.“Por isso, são menos suscetíveis a ataques de fungos e bactérias”, esclarece Neide Gonçalves.
Estima-se que o mercado mundial de Orgânicos movimente cerca de U$25 bilhões/ano, sendo que o Brasil participa com 10% desse montante. Dos U$250 milhões, em torno de 4/5 fica no mercado interno para consumo in natura e o restante, algo em torno de U$50 milhões (os dados são imprecisos), são destinados à exportação. Dentre os maiores importadores estão União Européia, EUA e Japão.
Os itens mais requisitados pelos clientes do exterior são os grãos, sobretudo a soja. O café tem despertado especial interesse para a fabricação de licores. A pauta de negócios inclui mel, própolis, açúcar mascavo, óleos, essências e algodão, dentre outros. Uma gama variada de Orgânicos cujo valor se dá não apenas pelas virtudes enquanto alimentos, mas também pela utilização como matéria-prima nas áreas de cosméticos, têxteis e outros produtos.
Marchinhas alegres, jovens mamães de shorts e cheiro de lança-perfume, mesmo nos bailes infantis, são minhas lembranças mais remotas do carnaval, no Rio de Janeiro dos anos 50. Adolescente em Copacabana, eu via a excitação dos adultos com o carnaval como oportunidade única de evasão e liberdade numa sociedade conservadora e provinciana.
A sensação era de que o carnaval tudo permitia, todos os desvios e excessos, todas as liberdades negadas durante o resto do ano. Beber, cheirar lança-perfume, beijar a boca de estranhos, apaixonar-se, até mesmo transar, viver um romance de carnaval. Pacatos pais de família saíam fantasiados de mulher no sábado e só voltavam na quarta-feira, eram recebidos como se nada houvesse acontecido, e a vida continuava.
O carnaval era a grande válvula de escape numa sociedade muito conservadora e hipócrita, cheia de tabus e moralismos, acentuados pela desastrosa passagem de Janio Quadros pelo poder, que começou com a proibição do biquíni e do lança-perfume.
Também durante a ditadura o carnaval serviu como rara oportunidade de evasão, mas depois da democratização, com a sociedade conquistando todas as suas liberdades, o carnaval passou a ser só mais uma festa popular, a maior delas.
Nos anos 60, antes do carnaval perder a inocência, da marchinha dar lugar ao samba-enredo e ao axé, eram os bailes pré-carnavalescos que incendiavam o desejo e a fantasia dos que não tinham idade para entrar. Eram em boates de Copacabana, à tarde, em dias de semana, o carnaval secreto dos casados e comprometidos, antros de devassidão e luxúria. Lembro-me dos malandros e conquistadores marrentos que diziam que o carnaval era para amadores; o dos profissionais era o ano inteiro.
Hoje, todo mundo encontra o que quiser em raves, bailes funk, escolas de samba, festas punk, clubes de suingue, de sadomasoquismo, boates e saunas gays e héteros, a internet é um carnaval permanente de liberdade, todas as drogas e oportunidades de devassidão estão ao alcance de todos os bolsos, desejos e preferências, todos os dias e noites do ano. O carnaval voltou a ser para amadores.
fonte: Sintonia Fina/ Nelson Motta
Pat Dollard
Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia
Ed.Objetiva
Sem censura, restrições ou julgamentos, Nelson Motta narra com paixão e irreverência a vida eletrizante de Tim Maia
Raios crescendo em fonte em tarde repleta de nuvens. Romualdo percebe sua mão fria diante da incumbência. Desatarraxar míseros parafusos. Resultados da ânsia de fecho da alma humana encalacrada. Ele faz frete e o dinheiro que recebe não faz frente às suas necessidades, mas isso não tem importância, para quem parece se acostumar com a rotina e perder o sentido do resto.
No epicentro da sua rotina, o desmonte de um móvel. O dia, um sábado chuvoso. Sábados não são recomendados pelos condomínios para mudanças, mas quem dá bola para isso se é o único dia realmente livre para as pessoas ciganas, as que mudam a cada ano em busca de valores imobiliários mais atraentes.
A não ser que os domingos fossem autorizados para estes tipos de trabalho, mas aí teria aquela coisa católica, que para os judeus seria sábado e assim por diante. Este argumento, porém, seria refutado por policiais, médicos, motoristas de ônibus, bombeiros, jornalistas e outros representantes de profissões consideradas essenciais.
Diante da mobília a ser manuseada, a chave de fenda suspensa entre o dedo indicador e o médio e os demais dedos libertos, tamborilando na superfície da madeira. Era um simples armário que carregava o fardo das roupas cansadas de envolvê-lo em dias de queixos batidos.
Num suave aperto, a chave encontra sua fenda como encaixe de um quebra-cabeça com peças ausentes. Escorrega como graxa e repica no solo ecoante como baqueta em tambor. Não esmorece nunca Romualdo, acostumado tanto a mudanças quanto a empunhar dedos na limpeza de cristais da mansão de um empresário famoso, este que está mudando de casa hoje.
Carinho no cabo em acrílico repossuindo a peça desfalecida. Agora a mão rígida lembra a de um espadachim à procura da brecha que verte sangue e lágrimas. Fenda funda e propícia ao primeiro desparafusar, sentido anti-horário: equilíbrio entre força e destreza; atenção e domínio do corpo sobre as inabilidades. Parafuso que gira. Tempo que corre para trás. Memória a fundar hipóteses sobre a engenharia das coisas. Passa largo Romualdo, sem saber o que pensar. Não há o que pensar no desparafusar.
Chave Philips, chave de boca, alicate, mala de ferramentas a viajar de móvel em móvel. No décimo parafuso, reflete, enxuga o suor polpudo e, novamente, baixa a cabeça, atos repetidos e desconexos. A mecânica superando a origem da criação. Faltam almas a ignorar a rotina. Parafuso deixa a rosca desolada, tragédia do aparte. Com as duas peças na mão direita, a que não é sinistra, somatiza a frieza da matéria e o calor dos seres, na oposição da criação. Processos estranhos esses da desconstrução.
Romualdo faz frete. Faz troça da vida em troca. O ser burlando a essência, deslocando no ar como gaivota. Fração de minutos e o caminhão está cheio, pneus oprimidos. Dores nas costas do carrega-descarrega. Romualdo olha para o parceiro Fernando à direita da boléia. Pretende um dia mudar de vida.
fonte: Newsletter Jayme Copstein
Fernando Sabino
- É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo?
- Sei dizer não senhor: não tomo café.
- Você é dono do café, não sabe dizer?
- Ninguém tem reclamado dele não senhor.
- Então me dá café com leite, pão e manteiga.
- Café com leite só se for sem leite.
- Não tem leite?
- Hoje, não senhor.
- Por que hoje não?
- Porque hoje o leiteiro não veio.
- Ontem ele veio?
- Ontem não.
- Quando é que ele vem?
- Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem.
- Mas ali fora está escrito "Leiteria"!
- Ah, isso está, sim senhor.
- Quando é que tem leite?
- Quando o leiteiro vem.
- Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê?
- O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada?
- Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade?
- Sei dizer não senhor: eu não sou daqui.
- E há quanto tempo o senhor mora aqui?
- Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso agarantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos.
- Já dava para saber como vai indo a situação, não acha?
- Ah, o senhor fala da situação? Dizem que vai bem.
- Para que Partido?
- Para todos os Partidos, parece.
- Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui.
- Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida...
- E o Prefeito?
- Que é que tem o Prefeito?
- Que tal o Prefeito daqui?
- O Prefeito? É tal e qual eles falam dele.
- Que é que falam dele?
- Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é Prefeito.
- Você, certamente, já tem candidato.
- Quem, eu? Estou esperando as plataformas.
- Mas tem ali o retrato de um candidato dependurado na parede, que história é essa?
- Aonde, ali? Uê, gente: penduraram isso aí...