"Entre gangues juvenis de negros, de hispânicos e de orientais, violentas, ignorantes e intolerantes, Clint Eastwood vive os últimos dias do viúvo Walt Kowalski e faz de "Gran Torino" o seu filme mais maduro. E mais duro. Veterano da Guerra da Coreia e operário aposentado da linha de montagem da Ford, Walt está velho e doente e vive sozinho em um bairro decadente de uma cidade do interior. Consumido por remorsos e culpas, e cercado por vizinhos de caras, línguas e hábitos estranhos, mergulha em um pesadelo multicultural.
Não é preciso conhecer profundamente os Estados Unidos, nem amar ou odiar os americanos, para reconhecer neste filme um clássico contemporâneo, cheio de som e fúria, narrado com secura mas temperado com humor ácido e discreta delicadeza, sobre a América atual, sua decadência, suas contradições e impasses.
Não é uma metáfora da tolerância. É o improvável encontro, numa América conflagrada, de dois seres humanos, dentro de um insuperável desencontro cultural e geracional, ético e étnico, sem esperanças.
Para a geração de Kowalski, e sua fé nos valores americanos, na liberdade, na justiça, na ética do trabalho, são tempos sombrios. Seus filhos quarentões engrossam as multidões de vendedores e picaretas, são perdedores e predadores, esperando a sua magra herança. Seus vizinhos são chineses, ou coreanos, ou mexicanos, e não só das primeiras gerações de imigrantes pobres e trabalhadores, ansiosos para se integrar na vida e no sonho americanos. Mas dos seus filhos, criados na América da opulência, do consumismo e da permissividade, que perderam as suas tradições culturais e assimilaram os piores vícios, violências e intolerâncias dos jovens americanos.
Kowalski, arquetípico americano da geração que construiu a ferro e fogo uma nação livre e próspera, não tem lugar no novo mundo multicultural da cidadezinha do interior, que poderia ser todas ou qualquer uma, onde vivem milhões de Kowalskis (e Eastwoods) perplexos com as transformações da América e de seus valores mais profundos e amados. Muito triste, muito sincero, muito bonito. E sem pedir desculpas".
Fonte: sintoniafina.uol.com.br
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