Naquele tempo, logo depois das diligências, quando estrada era tudo carreteira e ônibus não tinha privada, viajei de Bagé a Santa Maria. Passava uma hora, se tanto, que tínhamos deixado para trás o restaurante de beira de estrada, levando no bucho uma feijoada que a uns mergulhava em bem-aventurança, a outros, em aflição.
Como ainda havia umas quatro horas de sacolejo pela frente, tentei matar o tempo, passando os olhos pelos demais passageiros. Ninguém de chamar a atenção. Éramos 60 pessoas compartilhando absoluta falta de intimidade. Até os que se acompanhavam, só cochichavam mesmo as banalidades.
De repente, a modorra se estilhaçou, com a voz estrangulada de angústia saindo de entranhas:
- Para el coche! Para el coche!
O motorista guinchou no freio. Um castelhano clinudo, veio correndo lá do fundo, segurando a barriga como se recém tivesse sido estripado, e mergulhou na paisagem. Só que era descampado, não havia nenhum atrás-da-árvore.
O ônibus se acendeu em murmúrios. A situação do castelhano era precária. O que fazer, o que não fazer para lhe poupar constrangimento na volta. Um sorriso de compreensão porque a vida tem seus naturais? Quem sabe fingíamos não entender castelhano e não ter percebido o que acontecera?
Pois estávamos todos nestas indecisões, quando o castelhano voltou. Subiu no ônibus muito senhor de si, estufou o peito com olhar de triunfo, bateu com ruído as duas mãos na barriga e proclamou ao mundo:
- Ahora, si, soy otro hombre! Siga el coche!
Todos baixamos os olhos, encabulados.
Fonte: www.jaymecopstein.com.br/
O que prova, Kyria, que somos sempre tão iguais e absolutamente diferentes. Essa é uma teoria sobre a qual ando pensando muito. E aproveitando: das coisas que explicam a eventual falta de uso do cérebro no ser humano, o boxe é uma delas. bjss. Vê
ResponderExcluirAh...gostaria que você lêsse meu posto o Criative-se. Gostaria de ouvir sua opinião..ou visão pessoal. bjs