Fios mais fios que não se ligam, não se conectam a lugar nenhum nem a você, que não sabe de onde são e para que servem, mas que você foi juntando ao longo da vida, mesmo mudando de casa quase de dois em dois anos. E a quantidade de pés de geladeira velhos, roscas, parafusos que você nunca usou e com certeza, nunca vai usar? Você já reparou nas xícaras e mais xicrinhas que vai colecionando e juntando apesar de trincadas e quebradas nas asas, mas que eram de sua mãe e você tem receio de jogar fora, de deixar para trás? Será que você está deixando sua mãe para trás?
Para que servem tantas revistas e livros que ocupam caixas e mais caixas? Como será que eles couberam no outro apartamento? Aparentemente, eles são a causa do caos instalado em todos os cômodos do novo apatamento. E os papéis e jornais que você foi juntando esquecendo-se que você nunca os consultou em momento algum da vida. Depois do Google e da internet, para que juntar jornal velho e revistas de edições comemorativas? Não é melhor rasgar tudo ou queimar para, pelo menos, curtir a enorme fogueira da própia vaidade?
As vasilhas de inox que você comprou e guardou para usar, um dia, em uma casa que não fosse provisória, mas que nunca foi permanente. E os apetrechos da culinária japonesa, para os rituais de shushi e sashimi com os amigos, que você não vê faz tempos? E o equipamento de foundue que está parado há tanto tempo, que você acha que nem sabe mais misturar os queijos ou fazer as pastas? E as cartas, os telegramas, que já nem se usa mandar você fez questão de guardar numa pasta encima do armário das inúmeras casas que você teve? E os cabides do outro apartamento que não cabem mais nos armários do novo?
Na internet, o apartamento que você acaba de se mudar é lindo. Parece o apartamento dos seus sonhos, com três quartos, banheiros, salas de mármore branco, uma cobertura com piscina, sauna e churrasqueira. Mas quando você entra com os móveis, ele ficam desengonçados, não acham seu lugar. E as cortinas? As janelas encolheram ou foi você que não calculou direito?
E a geladeira e o fogão que parecem velhos e sujos na cozinha nova? Onde está a torneira do gás, que você não acha na cozinha? Nem com lanterna dentro dos armários você consegue localizar a passagem de gás para fazer um café. E a cabeceira da cama de casal, que não combina mais com a decoração? E os móveis de sua mãe que morreu e você não quis se desfazer deles? E a cadeira de balanço dela, onde você põe agora? Ela está contribuindo para mais vazio ainda no novo apartamento. E os vestidos dela que você separou e não tem espaço nem para os seus?
E os três canários belgas, presentes do seu irmão, que você não sabe onde pendurar? Você gostaria de soltá-los, dar liberdade, porque não gosta de pássaros engaiolados, mas seu filho não permitiu jamais, pois o tio também partiu e ele repete diariamente a tarefa de alimentar as aves e limpar as gaiolas como ele sempre fez enquanto viveu. E a cadela Frida, que está mais perdida que a dona da casa e fica grudada nas pernas dela, com medo de que todos saiam e a abandonem num lugar que ela não conhece nem os cheiros e barulhos?
Mudar é isso? Deixar para trás as lembranças ou carregar seus fantasmas dentro das caixas que se acumulam em cada cômodo? Mudar é enfrentar a burocracia do protocolo para a transferência de endereço do telefone, da TV a cabo e da internet banda larga. É telefonar 10, 20 vezes e ter dois protocolos de cada ligação e , mesmo assim, não ter resolvido seu problema. O telefone continua mudo, apesar dos insistentes pedidos protocolados e confirmados. Os pontos da TV a cabo estão cimentados e não podem ser instalados, mas tem que constar no protocolo que o serviço foi feito.Que mudança é essa que você tem que falar, a todo momento, com uma máquina eletrônica, que repete: "Não entendi". E a máquina entende alguma coisa? Você tem que falar o que está programado, imagine se eu começar a xingar a máquina? Será que ela vai entrar em pane ou em curto circuito porque do lado cá você já surtou há tempos? E tem vontade de parar de mudar e de pagar por todos os serviços que você já tinha, mas que eles cobram de novo. Mudar é começar de novo? Espero ansiosamente por esta nova vida.
Fonte - Estado de Minas/ Déa Januzzi dea.januzzi@uai.com.br
sabe quantas vezes eu me mudei depois de casada? 10!!
ResponderExcluirsou expert em mudanças, se precisar, me chame...rsrs