sexta-feira, 6 de março de 2009

DANUZA LEÃO

Quantas mentiras nos contaram! Foram tantas,
que a gente bem cedo começa a acreditar e ainda por
cima, se acha culpada por ser burra, incompetente e
sem condições de fazer da vida uma sucessão de vitórias e felicidades.
Uma das mentiras: que nós, mulheres,
podemos conciliar perfeitamente as funções de mãe,
esposa, companheira e amante, e ainda por cima ter
uma carreira profissional brilhante.
É muito simples: não podemos.
Não podemos. Quando você se dedica de
corpo de alma a seu filho recém nascido, que na hora
certa de mamar dorme e que à noite, quando devia
estar dormindo, chora com fome, não consegue estar
bem sexy quando o marido chega, para cumprir um
dos papéis considerados obrigatórios na trajetória de
uma mulher moderna: o de amante.
Aliás nem de companheira: quem vai
conseguir trocar uma idéia sobre a poluição da Baia
de Guanabara se saiu do trabalho e passou no
supermercado rapidinho para comprar uma massa e
um molho já pronto para resolver o jantar, e ainda
por cima está deprimida porque não teve tempo de
fazer uma escova?
Mas as revistas femininas estão aí, querendo
convencer as mulheres - e os maridos! - de que um
peixinho com ervas no forno com uma batatinha
cozida ao dente, acompanhado por uma salada e um
vinhozinho branco é facílimo de fazer - sem esquecer
as flores e as velas acesas, claro - e com isso, o
casamento continuará tendo aquele toque de glamour
fundamental para que dure por muitos e muitos anos.
Ah, quanta mentira! Outra grande, diz respeito
à mulher que trabalha - não a que faz de conta que
trabalha, mas a que trabalha mesmo: no começo ela
até tenta se vestir no capricho, usar sapato de salto e
estar sempre maquiada; mas cedo se vão as ilusões.
Entre em qualquer local de trabalho pelas 4 hs da tarde
e vai ver um bando de mulheres maltratadas, com o
cabelo horrendo, a cara lavada, e sem um pingo do
glamour - aquele das executivas da Madison.
Dizem que o trabalho enobrece, o que pode até
ser verdade. Mas ele também envelhece, destrói e
enruga a pele, e quando se percebe, a guerra já está
perdida.
Não adianta: uma mulher glamourosa e pronta
a fazer todos os charmes - aqueles que enlouquecem
os homens - precisa, fundamentalmente, de duas
coisas: tempo e dinheiro.
Tempo para hidratar os cabelos, lembrar de
tomar seus 3 radicais livres, tempo para ir à
hidroginástica, para ter uma massagista tailandesa e
um acunputurista que a relaxe; tempo para fazer
musculação, alongamento, comprar uma sandália
nova para o verão, fazer as unhas, depilação; e
dinheiro para tudo isso e ainda pagar uma excelente
empregada - o que também custa dinheiro.
É muito interessante a imagem da mulher que
depois do expediente vai ao toalete - um toalete cuja
luz é insuportavelmente branca e fria - retoca a
maquiagem, coloca os brincos, põe a meia preta que
está na bolsa desde manhã e vai, alegremente, para
o happy hour.
Aliás, se as empresas trocassem a iluminação
de seus elevadores e de seus banheiros por lâmpadas
âmbar, os índices de produtividade iriam ao infinito.
Não há auto estima que resista quando elas se olham
nos espelhos desses recintos.
Felizes são as mulheres que têm cinco minutos
- só cinco! - para decidir a roupa que vão ao
trabalho. Na luta contra o relógio, o uniforme termina
sendo preto ou bege, para que tudo combine sem que
um só minuto seja perdido. Mas tem as outras, com
filhos já crescidos: essas, quando chegam em casa,
têm que conversar com as crianças, perguntar como
foi o dia na escola, procurar entender porque estão
agressivas, porque o rendimento escolar está baixo...
E ainda tem as outras que, com ou sem filhos,
ainda têm um namorado que apronta, e sem o qual
elas acham que não conseguem viver (segundo um
conhecedor da alma humana, só existem três coisas
sem as quais não se pode viver: ar, água e pão).
Convenhamos que é difícil ser uma mulher de
verdade. Impossível, eu diria.



fonte: O Estado de São Paulo/2002

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