terça-feira, 6 de janeiro de 2009

PRESENTE COM ALMA - Déa Januzzi

Vida é uma palavra que quero pronunciar neste início de ano. Quero viver, mesmo que a partir de coisas simples, banais, como disse a minha amiga Mary Arantes Figueiredo. Ela tem um texto lindo que fala das delicadezas de Deus, para nos conectar com o que o universo tem de mais sagrado.
Durante o ano, vou relatar a minha lista de coisas bem simples que pretendo fazer em 2009, mas hoje quero que os leitores curtam as preciosas coisas banais da minha amiga Mary.
Ela, por exemplo, tem uma amiga, cujo maior prazer é dar água para beija-flor. "Ela liga a mangueira para molhar as plantas e, vez por outra, um beija flor vai de encontro ao esguicho com seu longo bico. Deve ser uma benção exercer uma função dessas - garçonete de beija-flor. Profissão ainda não reconhecida, mas sobretudo invejada."
Mary tem outra amiga que borda. "Bordar parece função antiga, dessas que não se fazem mais. Fico imaginando o prazer dela vendo brotar de seus paninhos flores, folhas e pássaros. Primeiro as asinhas, o biquinho e depois um passarinho inteiro. Meu pai é alfaiate, risca pano todo feito um arquiteto e depois a calça sai andando pela cidade, vai a festas, trabalha, namora. Também é coisa que me agrada muito dar vida a alguma peça que fica anos empoeirada nas gavetas à espera de minhas criações. É como se pudesse despertá-la de um longo tempo de espera, fazendo com que ela passeie pela rua com as mulheres, como as calças de meu pai".
Mary tem uma amiga que adora cozinhar. "A delicadeza que põe em cada detalhe faz parte de um ritual temperado de amor. Ela me faz sentir que cada comida pode ter sentimento. A cada toque, cada sabor conquistado, ela sorri e parece bailar de tanto prazer."
O maior presente que Mary já ganhou na vida foi uma abóbora gigante. "Achei uma lindeza sem fim ganhar uma abóbora de presente. A pessoa que me deu só poderia ser uma pessoa maiúscula, tamanha simplicidade. Andou léguas a pé carregando a maior abóbora que tinha dado na roça."
Ela já ganhou de presente um caderno de viagem feito por Paulo, "que colou nas páginas de uma revista todas as doces lembranças e as boas recordações. Tive a sensação de ter viajado com ele. A última vez que me senti assim, tão acariciada, eu ainda tinha mãe. Imagine ganhar um bolo de presente que a própria pessoa fez e, como se não bastasse ainda vir embrulhadinho num pano com uma frase linda bordada sobre a família? Essa amiga tem o dom de ser sofisticadamente simples."
Num certo dia dos namorados, Mary e o marido ganharam de uma vizinha "uma foto que ela tirou da nossa casa ao amanhecer. No cartão, ela dizia que era nosso ninho de amor visto da janela dela. Nunca vi nada mais simples e mais rico. Guardo-o como uma jóia, tamanho valor tem para mim. Os tesouros que ela me dá são sempre assim: um buquê de minirrosas do jardim para ser posto na jarrinha de Nossa Senhora, cestos com jambos da fazenda... São o que chamo de presentes significativos, presentes com alma."
Mary recebeu recentemente um vaso flor se cartão, o que despertou ciúmes e dúvidas. "Teria eu um admirador secreto?! Quem me enviou foi uma grande companheira de vida que me acompanha há anos e é como mãe para mim. Como não sabe escrever, resolveu enviar flores sem cartão."
Chorar de felicidade também é , para Mary, pura benção divina, não tem como não se comover com gestos como esse. "Sei só que Deus vive a nos presentear." Para ela, amigos merecem um céu à parte. "E quando piscamos os olhos está aí o fim do ano, de novo. Dizem que é a época do ano de maior índice pluviométrico. A época que mais chove e que a gente mais chora. Balanços de vida, listas de promessas e desejos. Uma vontade danada de acertar, começar outro ano cheia de novos planos. Tenho mania de faxinar nesta época do ano. Limpo armários e gavetas, releio cartões na certeza de que dificilmente jogarei alguns fora. Seleciono coisas, dou outras, na tentativa de carregar, uma mala menos pesada vida afora."

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